domingo, março 05, 2006

O esmaecer das cores


Como quem aguarda, deitado num banco envelhecido na estação de comboios, como quem lê um livro de pernas cruzadas na relva, como quem trinca uma maça enquanto ao lado a paisagem corre e a estrada corre e os ocres das paredes e as vinhas bem formadas nas encostas mancham o olhar, como quem, sentado numa cadeira, de pernas estendidas, ouve a rega e ouve a sua frescura pelo pátio adentro, eu aguardo, eu leio, eu mordo-me de curiosidade, eu escuto o amanhã. A fingir-me ausente, a captar com voluptuosidade o ancorar das cores nos meus olhos, do negro sobre o branco sobre o caprichoso cinza, a prestar atenção ao que dizem, a decorar com afinco a sua certeza e a sua energia. Fico, assim, em forma de desmaio interrompido, à espera que aquela névoa venha cair em cima da sombra e a transforme num sibilo semelhante ao que as lembranças fazem quando as vamos buscar ao fundo do corpo. Como quem ignora um sítio, as suas imperfeições e os seus humores, como quem tapa os ouvidos, se desprende do ruído circundante e prepara a pele para recolher a quantidade certa de luz.
E eu queria que isso durasse muitas horas, muitas viagens, muito tempo.

Os salteadores modernos


Coloco esta mensagem no sítio de uma instituição bancária mas presumo que ninguém a vá ler, uma vez que a colocação da mesma não lhes oferece nenhum retorno financeiro, mas não resisto em mostrar aqui o meu lamento, em jeito de grito de revolta. É ultrajante a cobrança pela visualização de cheques, disponibilizada por algumas instituições bancárias, através dos seus onerosos websites. Já não basta pagarmos uma enormidade de taxas, impostos, tributos, percentagens e outros métodos obscuros do género por todos os serviços inerentes à conta e à emissão dos ditos cheques e ainda temos que pagar um euro e meio se os quisermos visualizar on-line. Cheques que são, com quase toda a certeza, facilmente digitalizados e colocados no sistema para consulta.
Não, há que sugar até ao tutano o pobre trabalhador. Há que tornear a moralidade e extrair ao povo todos os tostões que podiam devolver alguma dignidade à sua vida, já de si, custosa.
Senhores gestores e representantes bancários, sinceramente, não acham isto tudo uma extorsão descarada? Ainda por cima vocês não roubam para comer. Vossas excelências saqueiam impunemente apenas para prolongar o estado de opulência em que se encontram.
Assim, também tenho milhões e milhões de lucro no final do ano. Assim, também eu pago afrontosas quantias para fazer anúncios publicitários, para patrocinar os três grandes clubes de futebol e para pagar os BMWs dos senhores directores.
Haja decência, por favor, haja alguma decência.